ANGU DO GOMES: A COMIDA QUE É UM PATRIMÔNIO CULTURAL CARIOCA

Está de viagem marcada para o Rio de Janeiro? Quer levar um amigo estrangeiro para comer um prato tipicamente carioca? Então, você precisa ir ao Angu do Gomes, onde a iguaria de mesmo nome detém o título de Patrimônio Cultural CariocaHá algum carioca da gema lendo esta postagem agora e se perguntando que comida é essa que nunca ouviu falar? Tudo bem. Provavelmente você é de uma geração mais nova, nasceu mais ou menos a partir da década de 90. Sim ou não, o que importa é que você não pode ficar sem saber que o Angu do Gomes é um clássico carioca, pois foi durante muitos anos, entre as décadas de 50 e 80, um símbolo do Rio de Janeiro, matando a fome de muitos cariocas por um preço popular. Seus principais consumidores eram, entre outros, motoristas de táxi, usuários de trem e da barca, intelectuais, notívagos, artistas e trabalhadores em geral que voltavam do expediente naquela hora em que o estômago pedia aquela sustância para o corpo voltar para casa com mais energia e contento. E sabe quem era um dos artistas que apreciava o Angu do Gomes, frequentando a carrocinha da Praça XV? O cantor e compositor que se derretia pelo Rio de Janeiro, o querido Tom Jobim.  

Se o Angu do Gomes é, de fato, uma iguaria que você desconhece, então deixe-me explicar por partes, começando pelas palavras que usei acima: "sustância", "carrocinha" e "notívagos". Tudo a ver. O prato é feito com fubá e miúdos de boi, ou seja, uma receita "pesada", para forrar bem o estômago. Daí a gente entende por que o Angu do Gomes era vendido apenas a partir das 17:00. Imagina, no calor que o Rio de Janeiro faz, as pessoas comendo isso na hora do almoço. Corriam o risco de dormirem no trabalho. Então, o Angu do Gomes era ideal para o final de uma jornada. A comida varava a noite dentro dos panelões das carrocinhas espalhadas por vários pontos da cidade: Praça Mauá, Praça Tiradentes, Largo da Carioca, etc. Comida de rua, gostosa, barata, forte, revigorante, servida nas madrugadas. Perfeita para o final das noitadas, perfeita para os boêmios. Sentiu por que esse "pratinho básico" fez tanto sucesso?  

O Angu do Gomes, que teve início em 1955 com o português Manoel Gomes, vivia um grande sucesso em 1977, com 40 carrocinhas espalhadas pelo Rio de Janeiro e uma média de mil refeições diárias. Mas, como todo negócio está sujeito a altos e baixos, o Angu do Gomes não resistiu à crise econômica dos anos 80, precisando recolher sua última carrocinha na década de 90. Mas o que é bom não pode ficar esquecido no tempo, ainda mais um sabor que marcou tanto a vida e a memória de tantos cariocas. Foi pensando nisso que Rigo Duarte, neto de Basílio Moreira (um dos antigos donos do Angu do Gomes), apostou na retomada da marca, e hoje são três estabelecimentos que vendem o tradicional Angu do Gomes, nos bairros da Saúde, de Botafogo e do Centro. As carrocinhas não voltaram a compor o cenário carioca. Uma pena. Sinal de que os tempos mudaram. Mas a iguaria continua como antes e não está mais sozinha. Entrou para um cardápio na companhia de muitos petiscos da atualidade, como os bolinhos de feijoada. O angu é o ingrediente mais famoso da casa, é lógico, mas, para entrar na mesma panela da modernidade, integrou-se aos bolinhos. Daí saem da frigideira, por exemplo, bolinhos de angu com recheio de rabada desfiada.   

Se você salivou com esses petiscos, não deixe de consultar o site da marca para saber de muitos outros que integram o menú. Aproveite e dê uma olhada no álbum de fotos para ver quanta gente famosa já passou pelo Angu do Gomes. Anote os endereços e reserve um horário em sua agenda. Eu fui num feriado no botequim da Saúde. Precisei esperar cerca de vinte minutos na fila. O local fica cheio. Prepare-se para isso e para dizer adeus à dieta.   
          
Em frente ao botequim Angu do Gomes da Rua Sacadura Cabral (Saúde), há uma réplica da carrocinha da marca que fazia ponto em diversos locais do Rio de Janeiro. O angu ficava dentro desses panelões. Muitos trabalhadores paravam em frente para fazer a refeição.

Dentro do Angu do Gomes da Rua Sacadura Cabral. É um botequim com cara de restaurante ou vice-versa. Espaço relativamente pequeno, então quando a casa está cheia, as mesas dos clientes ficam bem próximas umas das outras.


De petiscos, pedi meia porção de polenta frita, um bolinho de feijoada, um bolinho de angu com rabada e um bolinho de angu com camarão. Tudo muito bom. Só o recheio de camarão é que não me conquistou. A porção de polenta frita dava para eu dividir com mais duas pessoas, pois, para mim, depois de uns sete pedaços, o gosto da polenta frita já começa a ficar um pouco enjoativo. Também não dá para comer muitos bolinhos porque eles são grandes. Eu fiquei satisfeita com esses três. Afinal, depois de muita fritura, meu estômago começa a recusar.


Olha só o recheio generoso desse bolinho de angu: rabada desfiada. Quitute diferente e gostoso. Para quem gosta de uma cervejinha, os dois formam um belo par, não acha?

O bolinho de feijoada do Angu do Gomes foi o melhor que já comi e o mais farto. O bolinho é uma mini feijoada. Vem com couve (muita) e bacon por dentro.

A polenta frita quentinha é muito boa. Estava bem crocante por fora e molinha por dentro. Parece uma batata frita, mas é mais "pesada". Quero dizer, não dá para comer o tanto de polenta frita que você comeria de batata. Bem, pelo menos, na minha opinião. 


Eis aqui o carro-chefe da casa: o tradicional Angu do Gomes. Esse prato não foi para mim, mas para meu marido, que ama. E ele se lembra com muita saudade do tempo em que sua mãe parava na frente da carrocinha e comprava o angu para ele. Apesar do prato ser "pesado", mesmo sendo criança, ele adorava. Eu, devo confessar, não gosto muito. No prato tradicional, vem um pedaço de rabada por cima do angu acompanhado de miúdos de boi. Então, para você que não sabia, foi este o prato que muito fez parte da vida carioca, principalmente a noturna. Mas, quem quiser experimentar uma versão moderna, pode pedir o Angu de Frutos do Mar, por exemplo.


O Angu do Gomes da Saúde fica ao lado desta praça, o Largo de São Francisco da Prainha, tomada por prédios coloniais onde funcionam alguns bares bem simples. 


Ao fundo, à esquerda, onde está o toldo vermelho, fica o Angu do Gomes. Este é um cenário antigo da cidade, mas bem perto da parte revitalizada da Praça Mauá, a apenas cerca de 15 minutos de caminhada do Museu do Amanhã.


A ida ao Angu do Gomes pode ser combinada com algumas visitas na região. A atração mais próxima é a Pedra do Sal (quatro minutinhos andando), local a céu aberto onde toda segunda-feira à noite há roda de samba. Ali, nesse dia, cariocas e turistas se encontram. Muitas pessoas vão comer no Angu do Gomes antes de seguirem para a "pedra". Outros lugares de visitação próximos são o Museu do Amanhã, como já falei acima, o MAR e o Cais do Valongo. Programas culturais em diversos sentidos.


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